21 de setembro de 2020

Madrugada fria  peito inflado tanto sentimento batendo nada muito claro.

Um presságio

grito dentro

fora calado


Outro cigarro 

dor, desejo 

sonhos 

e o gosto amargo

de ser quem não sei


Sou  lagarta

que entrou no casulo

sem saber
quando sairei.


muito vazio pra pouco espaço

muito dizer pra pouco rebolado


não estou na melhor fase

estou dentro do casulo


Um dia saio borboleta
e dou voltas pelo mundo 


8 de setembro de 2020

tempo do tempo

venho do tempo 
onde não há mais tempo 
tudo acontece rápido demais 
para os jovens argumentos 
 
O que entendemos sobre o tempo ? 
sobre quem somos e de onde viemos ?

sem enterrar umbigos 
aterramos rios e riachos 

sem medo do próprio descaso 
descaso com si próprio 
vendemos terras grilada
bebemos água cagada 
e achamos que nada 
nada disso 
afeta nossa rotina diária 

venho do tempo 
onde não sobra tempo 
falta 
4 horas de transito, 8 de trabalho 
2 de almoço 
que horas serei crítico e politizado? 

politicas e policias 
policias e milicias 
milicias  e malicias
não associe a mandinga

mandinga é a arte de correr com o tempo 
fazer do tempo, templo de aprender 
tornar-se senhora do tempo 
Sujeita que conseguiu se conhecer

No tempo que não se respeita 
os senhores e seus reinos 
onde a Terra, a água e o fogo 
são só elementos 

não elementares 

eu me desfaço 
como ampulheta 
me desdobro 
e deixo em minhas letras 
registro para a História.

7 de setembro de 2020

ibirapitanga

É da pele preta que essa voz fala

em nome da negrura dos meus sentimentos 

afirmo os acordos sórdidos 

e falsos consentimentos 

de quem teve seus direitos negados 

suas terras roubadas 

a cultura assassinada

e as vidas 

as vidas são jogadas a mercê do tempo 

do descaso e da violência 

só que eles não contavam

com a nossa resistência 


Eu, eu sou brasileira 

do projeto de Brasil que deu certo 

que miscigenou, clareou

ascendeu e consumiu 

Essa é a pátria que nos pariu 


Onde grilagem, milícia e estupro 

é tão comum 

que nem gera tumulto 


A juventude arrancada das ruas 

 3º maior população carcerária

indígenas, quilombolas e ribeirinhos

arrancados pela especulação latifundiária


Das nossas raízes querem arrancar todas

do nosso ventre à nossa alma. 

depois perguntam porque eu não estou calma 


Eu sou filha dessa terra, 

invadida por filhos da ignorância

que matam todos os dias nossas crianças 

na bala perdida

na água poluída 

na comida envenenada

na floresta devastada 

nos matam

tiram o direito mais humano 

de ser


Vistos como não humanos
temidos como meta humanos
em empregos sub humanos

assim se passam anos
gerações, 

mesmo sistema colonial
só que agora com filtro do Instagram


A negrura dos sentimentos
a mestiçagem da minha pele 

e minha paixão por mate guarani
me trouxeram até aqui 

sou filha da terra ibirapitanga

e quero rio pra bebe e banha

semente pra colher e plantar 

fogo pra cozer e alumia.

sou filha da terra
e dela ninguém vai me tirar

5 de setembro de 2020

sentidos turvos

Sinto meu corpo
estasiado, com medo
minha cabeça acelerada
estou doente.

Meu corpo sente dor
dor  no peito 
que o olho transbordou

roer unhas
dormir de mais
roer unhas
dormir de menos

Álcool
desespero
álcool
ainda sinto medo

Me sinto doente
nem letras saem direito
culpa do peso
peso da culpa

Ansiedade me perturba
as palavras seguem turvas
eu desisto,
por hoje é isto! 

8 de agosto de 2020

A órfã

Momentos antes de cerrar os olhos
são momentos que busco forças
para abri-los no dia seguinte. 

Tudo tão incerto
eu tão incrédula
a inveja da ignorância
soa a maior das burrices.

Querer não saber
para não sofrer a dor da escolha.

Feita de água e terra
assim como o lodo, afundo em mim
findo e renasço 
todo dia
nesse mesmo horário. 

Quando vejo o mundo girando
fora do meu quarto    calada
tento não exalar as dores 
de ser quem sou 

Nada faz sentindo!
Qual é o sentido de existir? 
Tenho pra quem ir ?
Há algum lugar onde a dor não possa me alcançar ? 

Tem vezes que sinto ruir 
dentro de mim
abismos que eu mesma construí.

A ignorância foi dádiva
eu não soube ouvir 
agora aqui, isolada     higienizada

Em processo lento 
e doloroso de
 descolonização 
em processo de aceitação,
entender que não me entendo
é a constante busca 

Vim à Terra em busca de mim
Onde estou? 

Lágrimas rolam pelo rosto
sorrisos forjados ao dia
calmarias fingidas à noite 
amores e dores que se misturam

A insegurança
de ser só uma criança 
órfã de si.

28 de junho de 2020


Preta, deixa eu te dizer 
pode comemorar, você se formou
ganhou prêmios
realizou seu sonho de arte-educação.

Preta, deixa eu te dizer
aquele grande amor, nem amor era
nessa nova era, outros desamores já vieram
e como todos que conheceu, também se foram.

Preta, você é poeta
sempre foi
seu cabelo cresceu
o inverno vem e volta
cada ano mais escasso.

Preta, deixa eu te dizer
que todo aquele medo da cidade grande se foi
mas o medo da solidão não, nem tudo mudou
estamos em solitude
atitude de se amar em plena solidão.

Preta, as crianças estão enormes
tu já viajou sozinha, conheceu o Rio de Janeiro, São Paulo e Uberlândia
já ficou e já vazou do próprio estupro
eu não te culpo, eu não me culpo
não tinha como imaginar o que íamos viver isso
essa cicatriz não nos define.

Preta, descobrimos o amor
amor pelas nossas opiniões
pelas nossas posições e nosso desejos
hoje desejamos uma mulher linda
é não era brincadeira nada daquilo, você gostava sim de mulher
eu gosto de mulher, gostamos de uma cabocla, linda, preta, mulher.

Preta, deixa eu te dizer
passamos por poucas e boas
abusos, choros e muitas alegrias
e aqui estamos
vivas, negras, inseguras e radiantes
sedentas por vida.


19 de junho de 2020

Aspirante a dotora

Parece engraçado né não?!
Mas tô tentando manter meus pés no chão 
para poder voar 
sem perder minhas raízes 
Djamila, Nilma Gomes, Paulo Freire 
Tô lendo tudo sem freio 
quero o topo     não isolada 
vou ser petricia junto das aliadas

Entender o que é universidade 
falar com intelectual 
levar pra UFRGS minha ancestralidade
conquista nada banal.

São anos de estudo 
Esse PPG quero deixar escuro 
levar minhas ideias 
questionar falsas certezas 
um estudo sem frieza 
ser quente 
como água no fogão     na hora certa ferve
                                escrevo de forma leve 
Digo e repito 
Nilma lino Gomes
em você me inspiro    quem sabe virar uma Petronilha 
mudar o Brasil com educação antirracista
educar e libertar     libertar e se amar
logo vou tá lá
defendendo a dissertação
muitos falarão     foi fácil !
mas não trilham o meu caminho
Falar de mim é tranquilo
quero ver faze o que eu fiz  
sem perder o equilíbrio 

Ser da rua ser acadêmica 
ser sua    
sem nunca deixar de ser minha. 
Nessas linhas deixo lágrimas
que trancadas na goela
fizeram de mim
refém da sombra

É tiro     é grito
corre e fica vivo
    não chora
    não grita
    não explode
te dão sacode

Balançada as estruturas
frio no estômago
ao ver a viatura
            ditaduras
            ditam o fim da vida
no fim da rua
chão     trocação
menor de fuzil na mão

Sangue  e não é de menstruação
sem câmeras
a ação é pra valer
não existe fingir de atirar
ou fingir de morrer

Umbral exposto a lua    eclipse de sangue
pessoas doentes
mentes precisando ser salvas
e não será com palmas  ou likes

Fico enjoada
a ânsia que sinto
misto de dor   medo e revolta
não minto!
essa impotência dilacera,    gela
mas não me devora.

8 de junho de 2020

Noventa

Hoje completo 90 dias de isolamento
90 dias sem o abraço dos meus amigos
90 dias sem beijar minhas sobrinhas 
90 dias sem unir as mãos e gritar
Ieeee camaradinha 
 
Sinto o tempo passar entre os dedos
entre máscaras e álcool gel.
Sinto vidas se esvaindo entre os dedos 

são jovens negros
com medo da morte
da fome
do vírus 
e do fronte.

Minha mente não sabe pra onde ir 
por mais que eu queria o presente 
sentir o presente, vive-lo
da forma mais ancestral
com direito a meditação
banhos de erva e boa alimentação 
são os boletos, o aluguel e essa pressão
que assolam minha mente 
confinada em 30 metros de paredes.
 
Os dias passando, as folhas caindo 
março, abril...
saudades batendo, o peito se abrindo 
junho, julho.... 
boletos chegando e o emprego se indo 
agosto, setembro.... 

Tento lembrar o cheiro da rua 
o vento na cara enquanto ando de bike 
e nada disso eu lembro
mas falta pouco pra setembro 

90 dias e esse misto 
pressão sobre nossos corpos 
dores esvaziadas em copos
me controlo
não posso ser mais um corpo negro alcoólico 
eu oro
eu choro 
mas não paro

90 dias e um poema de amparo   






16 de maio de 2020

62° dia

São 02:50 
Sábado, não mais. 
Domingo! 
Quase 3 horas passadas desse novo dia e eu não consigo dormir. 
A preta tá aqui. 
Como ela é linda!
Ela sorri com os olhos, doce, quente.
Faz cafuné até adormecer e mesmo capotada ainda pergunta se estou bem. 
Ela me aquece por dentro.
Engraçado né?!
São cócegas no estômago que não deixam eu fechar os olhos. 
Assistimos a TV hoje, estamos em preocesso de descompressão.
Antes, imunes a qualquer medo ou má sensação, juntas estávamos no espaço.
Agora, em descompressões lentas, me vejo repleta dessa ânsia, desse medo do que está por vir. 
Juro que não sei do que é!!!

Me questiono se vai ser a saudades, a distância, o vírus pandêmico ou o descaso proposital do estado o meu maior pesadelo e eu não sei dizer.
EU NÃO TENHO CERTEZAS

Só sei que essa fricção, esse entrelaço de medo e nervoso dentro de mim, me fizeram perder três preciosas horas de sono.
Provavelmente eu deveria estar agarrada ao romance preto mais indígena que já habitou meu coração. 
Afinal ela vai partir logo e meu coração, mesmo querendo, não poderá partir, nem se repartir.
Nunca precisei tanto dele intacto!!

A preta vai ir levando meu coração. Melhor dizendo, ele a quer seguir, a todo custo. 

Queria que o tempo desse uma pausa pra nossa saúde mental. 
Mas concluí que tu, posturada e manhosa, foi a melhor pausa mental. 
Melhor remédio pra dor é o riso que sai da tua boca, o olhar doce e desbravador, revela a alma que não se esconde do amor. 

Tu me levou pra fora da Terra, fora da pandemia caótica corrupta e animalesca que vivemos.
Foi só nós, máscara para o mercado e amor esterelizado.

Eu estou te amando. Obrigado por tudo. 

2 de maio de 2020

Romance em pandemia

Luz de emergência
senhor do Tempo
me dê paciência
Logo volto a ser abóbora
enquanto isso
te pego de costas
você por cima
a cama grita
sorte minha
azar da vizinha
amanheceu o dia
seguimos
em picardia

Dois beijos
 uma gargalhada
eu cheirando sua nuca
você arrepiada

Fazendo piada
das nossas fantasias
e tão bela adormecia
depois de gozar mais um pouco
aquele encaixe de louco
com a boceta na boca
eu respondia

BOM DIA

Queria isso
todo santo dia
acabou o tempo
pro último beijo não sobrou tempo

Quem sabe na próxima estadia ?

26 de abril de 2020


Quem resiste também ama
Minha poesia fala de amor na maioria dos versos
não nego
mas confesso
 é que sempre quis ver o mundo se mudar
não sabe o que diz
fi! se sabe o que é ser uma mulher preta em busca de ser  feliz?
Olhar no fundo dos olhos daquele que te aborda "tu trabalha aqui?"
Ver gente ruir, enquanto outras nos roem....
Se jogada ao mar com anzóis.
Preta presa
linhas de tristeza
profundas águas
banhadas de sangue negreiro.
Não fico mais muda!
Me chamem de filhada puta
para ver quem eu vou parir.
Missão das cruzadas, encruzilhadas
linhas de navalha.
saias rodadas, fogo,  areia e cachaça.
lua , clareia
uivo, tormenta
alço voo
encaro quem me diz: pare!
cuspo verdades que te desmascare
Agressivas, solitárias
mal fadada de berço
Tanta mina preta pagando o preço
Vamos agilizar o troco
O comércio é livre,
livros para negociação
tráfico de informação
Eu vivo num ninho de cobra
cobra que cobra não morde
uma cobra conhece outra cobra, não precisa dizer quem é cobra.
E tamo cobrando, sem gentileza,
quebrando as taças e botando a mesa.

2 de abril de 2020

Vendaval

Ventania 
Virulenta vassourando
Viscerais vestígios
Vi ventanias voarem
Vi ventanias vosciferarem 
Vírus versa vozes
Vi vendavais virais
Vivarem vestígios
Vozes virulentam vento
Vento varre vírus
Ventanias viscerais 
                   verticalizam vozes

25 de março de 2020

É secular

Tudo instantâneo
tipo miojo
eu crente na verdade 
e você nem olha no meu olho 
E quando olhou
não me viu
me subestimou 
pra não ver que você tinha tantos erros quanto eu 
Eu errei em te querer 
tu errou em abusar do meu querer
E como querer não é poder 
nunca te tive 
tive só sonhos
ilusões 
Você nunca foi real 
real só a dor
a falta de amor
Próprio 
Próprio de uma menina negra que não sabe o que é 
Amor próprio
Só o que sabe é propriedade 
sempre privada
privada de soltar o cabelo, 
privada de soltar o verbo 
privada para esfregar enquanto,
o cabelo, o verbo e o peito 
seguem presos.
Privada de soltar as correntes
as algemas do último século 
É secular 
amar sem ser amada é secular 
chorar e não poder cair as lágrimas é secular 
desmoronar e se manter forte é secular
andar em círculos na tentativa frustada de esquecer quem amou 
É secular 
É Secular
E eu  rodei, 
rodei
rodei
Sem olhar em frente
atravessei 
nevoeiro de amor sorrateiro 
Amor capitão 
Amor engenho
Amor negreiro
Amor sinhá
Que prende, adoece, suga
amor que não liberta 
Quantas princesas Isabel hei de amar ?
Quantos capitão do mato falam de amor e não correspondem nos atos?
até encontrar a Firmina que mora em mim 
Quanto há de ruir?
até me deparar com a sete saias 
a mulher homem 
a Caboatá 
a que ponto minha dor há de chegar? 
Chegará o dia 
dia da alforria 
dia de ter direito 
como livre cidadã 
Livre 
Cidadã 
Mulher negra
Livre 
Cidadã 
Que luta, que corre, que é livre 
Para amar 
e ser sã.

1 de março de 2020

Spelmann

Sexo entre mulher preta
é mais que roçar boceta
são elos
mas francamente
foi uma sentada diferente
dessas que arrepia o corpo inteiro
no terraço fumamos a de cinco inteira
eu com a mão no seu cabelo
misturando doçura com cafeína
você empina
adrenalina
riso nos olhos da preta guria
seu tom pele barro
risonho
de quem faz arte na lama
no meio do caos
no meio da cama
no meio das coxas
enrosca, enrosca
essa tua língua solta
de quem faz piada da vida
me alucina
na lucidez do teu compasso
de reza
bruxa que se presta
mudou o dia do meu voo
agora sonho
alegra vida da poeta
que conheceu a garota
caixa d'água
que em mim derramava
afeto e picardia
ardia
o fogo que ela fazia
fomos fantasia
somos tesão
fogo e mar
maresia.

13 de janeiro de 2020

rascunho do tempo presente

Tem dias que acordo
e teu cheiro está por toda cama 

No silêncio da casa 
ouço tua risada 

Tô ficando louca 

Tem horas que me enrolo em tuas roupas 
tiro a paz de estar só 

Procuro você pelo cantos 
aí só encontro pó 

Partes microscópicas de tudo que não fomos
dos sonhos que se perderam 
da alegria de ser quem somos 

Sinto teu gosto em minha boca 

Que toda a distância fica pouca 
Perto do meu querer 

Tem dias que só queria não te querer 
Amor
sinto saudades de você